Inacabado - VII

terça-feira, julho 24


Porque é tão importante na vida humana ter um(a) companheiro(a)?
Assim começava o artigo do jornal matinal que resolvi ler enquanto Giovana prepara seu suco de laranja. Não que isso fosse um ritual de todos os dias, mas, era comum ao menos uma vez ao mês que estivéssemos os dois acordados de manhã antes do trabalho em casa e dispostos a sentar na mesma mesa.

Um ano e meio morando juntos e já não aguentávamo-nos mais, culpa de nossas rotinas estressantes é verdade. Gi trabalha como publicitária em uma agência famosa, aliás, é a assistente do dono. E eu sou um delegado de uma das piores DPs de São Paulo. Bom, melhor voltar a ler o artigo.
“É algo estranho, nos casamos após sairmos do colégio e nunca tínhamos nos olhado antes”.
Depoimento de alguém que realizou um sonho é verdade. Dizem que a melhor época pra encontrar alguém para casar e constituir família, é a juventude inicial, a adolescência nos Colégios. Bom, conheci a Gi na  faculdade. Tínhamos um amigo em comum, saiamos pras mesmas baladas, começamos a nos falar e aí, aconteceu.

“Querido, pode me passar a manteiga? Querido... Querido?!” – Desculpe, respondi enquanto dava a manteiga a ela. Minha concentração naquele pedaço de papel de má qualidade era algo que irritava. Ela odiava que eu lesse durante o café da manhã, mas não falou nada.
Linda, uma reportagem diz que nós só nos relacionamos por falta de um sentimento próprio de compaixão total. Giovana bate forte com suas mãos delicadas em cima da mesa de vidro – receio que a força tenha sido o suficiente para trincar o móvel – enquanto exclama: “Besteira! Nós relacionamos porque gostamos de nos relacionar, relacionamo-nos porque queremos prazer. Deixe de ser idiota Matt!”.

Um acesso de raiva, quanto tempo não à via assim. Gi era apaixonada por natureza, sua mãe a criou com o pensamento “case, case e tenha família. Você será feliz assim”. Eu fui criado do jeito comum, case se tiver a chance, se achar a pessoa certa.
Gi era a pessoa certa, mas eu temia não ser o certo para ela. Ela saiu pra trabalhar, não disse nem sequer um tchau. Certo... Devo ir embora também. Coloquei minha camiseta preta com os dizeres “Polícia Civil” nas costas e o colete à prova de balas por cima. Arma, distintivo, chaves, óculos escuros. Tudo certo.

Entrei no meu Corolla e andei pela rua, devagar, sem pressa. O farol ainda estava vermelho, então eu fui indo devagar para que quando chegasse lá ele já estivesse aberto. Deu certo, acelerei para atravessar a avenida. Dois quarteirões na mesma rua virei à esquerda para fazer o retorno e voltar à avenida para ir ao sentido certo, dois carros me acompanham.
Acelerei, sem olhar pra frente, concentrado nos carros que estavam atrás de mim, os dois começaram a disputar uma corrida e eu estava no meio do percurso. Sem olhar pra frente, não vi o caminhão da Eletropaulo que estava reparando a fiação elétrica.

E eu nunca pude dizer a Giovana, que queria casar com ela.