Depois de um dia de trabalho cansativo, resolvi não
ir pra casa. Andando pela agitada São Paulo à noite, peguei minha bolsa e fui a
um bar chamado John Paul, com temas de rock. Me sentei no balcão mesmo, exausta
e com raiva da vida. Me senti deslocada, mas nada que umas cervejas não
melhorassem. Pedi uma Budweiser e ali fiquei bebericando e observando o bar. As
paredes escuras, mesas e balcão rústico, aquele era um bar que despertava
curiosidade.
Como todas as noites pós-trabalho - ser
publicitário, ainda é considerado trabalho? - fui para um bar que já frequento
há tempos, o chamado Bull, nada demais ali, mesas e cadeiras de madeira, uma
banda de rock, todas as paredes pintadas de preto, iluminação baixa e mesas de
snooker. Sentia-me num filme americano. Sentei em minha mesa habitual, a última
colada à parede, pedi minha Heineken de sempre, e fiquei aproveitando o som,
olhei para balcão e vi uma garota sentada junto a ele num daqueles bancos que são
um pouco mais altos que os comuns. Cabelo longo cor loiro mel, pele extramente
branca, curvas brandas – seios fartos, cintura fina, “corpo violão”- pelo que
pude ver de suas pernas cruzadas, tinha coxas grossas... Típica garota de São
Paulo usava sapato de salto alto preto, calça jeans clara, uma camiseta de
manga longa preta e um cardigã rosa. Parecia preocupada com algo, bebia com uma
sede de quem queria afogar mágoas ou teria trabalhado muito.
Cada vez chegava mais gente, e nisso a banda que
tinha acabado de regular os instrumentos começou a tocar. Só pra eu ficar ainda
mais na fossa, começou a tocar Under the bridge, do RHCP. Fiquei olhando eles
tocarem, me lembrei de como minha vida era antes de vir para a metrópole. Senti
saudades. Estava sozinha triste e perdida em mim mesma.
Começava
o horário de pico do bar, tanta gente ali que parecia que não tinha mais como
respirar, a banda tocando Red Hot Chilli Peppers e a garota começou a prestar
atenção neles, ouvindo a música e, bebendo ainda mais. Um de meus defeitos, é
ser popular, sempre conheço alguém em algum lugar. Levantei-me da mesa para
deixar disponível a dois casais amigos que iam ali comemorar o noivado de um
deles. Aproximei-me do balcão, fiz questão de ficar perto, mas não tão perto da
garota. Mantive uma distância boa e pedi uma dose de uísque ao garçom e pedi
que ele desse uma dose à garota da bebida que ela quisesse, em meu nome.
Tequila
ela pediu, pedi ao garçom para que eu entregasse e assim o fiz. “Sua dose,
senhorita.”
Uma
tequila que desceu como se fosse nada. Não me importava mais com o que faria
daqui por diante, só queria me manter não sóbria. O homem que me ofereceu a
dose veio falar comigo. Eu diria que ele era especialmente bonito. Um homem de
aparentemente 24 anos. Os cabelos pretos, barba feita, olhos castanhos,
musculoso. Estava usando um Nike Biscuit SL, calça jeans preta, uma camiseta de
manga curta "decote V" branca, uma jaqueta de couro preta, e um
relógio no pulso esquerdo. Resolvi conversar com ele, já que foi gentil a ponto
de me pagar uma bebida.
Conversamos por um bom tempo, falei sobre
minha vida, meus problemas, ele falou sobre ele. Já era quase 11 da noite
quando resolvi ir embora. Ele se ofereceu para me levar, o que aceitei de bom
grado, já que não estava nem um pouco a vontade de esperar o ônibus. Apenas dei
uma condição, queria saber seu nome. “Chamo-me Wolf”, e dizendo, entrei em sua
Hilux preta e partimos em direção à meu apartamento. Talvez eu tenha sido louca
de partir com alguém que tinha conhecido no mesmo dia, mas confiei nele desde o
começo da conversa.
Em frente a meu prédio, ele desce do carro e
abre a porta para mim. Desço do carro, “então... tchau, Wolf” e pretendo dar um
beijo no rosto dele. Confesso que com a
intenção de beijar a boca, mas eu não precisei ter a intenção, pois ele queria
o mesmo. Entrelaçou minha cintura, olhou nos meus olhos por uns segundos, e me
beijou. Nunca esquecerei aquele beijo do desconhecido que fez eu me distrair de
minha vida sem graça por pelo menos uma noite. Resolvi mudar, devo essa decisão
a ele, Wolf. Olhei bem nos olhos dele e agradeci. Beijei ele mais uma vez, e
fui para meu apê. Nenhum telefone foi trocado, apenas um último olhar. Nunca
mais o vi, muito menos sua Hilux preta. Várias vezes nessas últimas semanas, me
peguei procurando na rua um vestígio da sombra daquele que fez eu ter vontade de
reerguer tudo de volta. Não pode ter sido apenas um sonho...